Manhã submersa do teu olhar
foi por ti que lhe dei o perfume
por ti rasguei ribeiros e dei
as romãs a cor do lume
Foi por ti que pus no céu
a lua e o verde o mais verde
nos pinhais
Foi por ti que deitei no chão
um corpo aberto como os animais
foi por ti que lhe dei o perfume
por ti rasguei ribeiros e dei
as romãs a cor do lume
Foi por ti que pus no céu
a lua e o verde o mais verde
nos pinhais
Foi por ti que deitei no chão
um corpo aberto como os animais
eu aqui estou toma - me noite
sem sombra de amargura consciente
do que dou nimba - te de mim e do
luar disperso em ti serei mais teu
e deixa - me derramado no olhar de
quem já me esqueceu
deixo meu corpo a dor da ausência
fica mais pequena
quando vejo o meu destino ordena
que por me experimentar de vòs me
aparte
que a mesma culpa fica grave pena
o duro desfavor que me condena
quando pela memória te reparte endurecer
os sentidos de tal arte que a dor da ausência
fica mais pequena
mas como pode ser que a mudança daquilo
que mais quero este tão fora de me não apartar
tambèm da vida ?
eu refrearei tão áspera esquivança porque
mais sentirei partir senhora sem sentir muita
pena da partida
onde esperar o sol
para te saudar primeiro
sò muros e persianas
passos apressados
vozes
um tombo no elevador
è uma toca o quarto
não tem ruas è um
mundo no roupeiro
um espelho onde
a espera muda
entristecida uma
velha um sangue
de impaciência
que nunca parti
estava algo cansado
um pouco afastei - me
à beira de um lago incluso
entre ervas
saí do tempo deixei
a tua cara
talvez apenas isto
seja depois
na onda crispa
desceu uma gaivota
foi uma promessa
depois vem a alegria
leve ilimitada
agora o que se vê
è sò um ponto de bruma
multidões de larvas
no fundo de um abismo
tenho de partir mas não sei
para onde
sò sei que tenho de partir
tenho medo mas tenho
de partir diz - me tu
por favor diz - me
mas sou deixado
a partir nada
me espera porém
tenho de ir
quis num compasso de espera
erguer a manhã à altura
sonâmbulo dos meus
sonhos
foi como quem apanha insónias
num campo de girassòis despentear -
- lhe os cabelos de menina
ainda lua já mulher
como se tornar a noite clara
fosse uma questão de palavras
acesas no amor eu sou a página
em branco em que tu escreves
e soletras palavras ao meu coração
silaba a silaba vindas do teu coração
è preciso voar para se viver verdadeiramente
intensamente o amor
quero beijar o horizonte
abraçar a paisagem e ver
a luz do dia que escurece
ser a bùssula perdida
no eterno mar do ser
quero ser a luz do sol
que na alvorada se acende
acordaste todos os astros
em mim e eu voltei a
viver
quero encontrar um antìdote
o veneno do teu sabor
nas minhas veias
como se o mármore fosse
capaz de ser quebrado
com o meu punho fechado
como se o muge irrompesse
numa ele limpa
sinto - me perdido no tempo
um dia tudo mudou
o sonho desiludiu
quando a sua sombra fugiu
num sentimento de abandono
numa viagem sem retorno
um dia tudo mudou
a brisa do mar
sinto a tua beleza atravessar - me
um sonho nas entranhas do meu
espírito inócuo branco
uma transparecia talvez
uma pureza
através da cólera do tempo
onde me perco na fantasia
do cheiro da maresia das
ondas que rebentam das
gaivotas
invento um imenso lugar de regressos
nestas mãos que se agarram os dias
como uma paisagem frágil
de papoilas
a maresia na curva de um poema
os contornos opacos do vento no
ultimo acorde de um cello
o retorno a impaciente ternura
dos teus olhos
e nessa geografia de invisíveis
amplitudes abre - se um par de
asas
um quebranto de tempo
na rua não dou a quem
pede o que pede
sò dou a forma como
pede
no amor sò dou o que o amor
me pede
não dou à forma
como pede
e à vida peço me dè leve
aquilo que ninguém pede
o sol não se põe os homens
è que o afagam em vão
cada coisa uma sò voz
a morte vem para sempre
a vida sò vem uma vez
mudem os ventos
as searas do Van Gogh
e verão
sò a cor arde nos campos
amarelos intactos
vermelhos infinitos
vertente ou vontade
virtude ou variante
violência ou vaidade
a arte nunca se repete
meu amor em sangue
cresço novo
morro vivo
sò o silêncio è sagrado
violentíssimo
ágil e antigo nada mais forte
nada mais inocente
que manter e sentir o anonimato
no pleno exercício do amor denso
o ècran duro da cal
o sem abrigo o rouxinol
o assustares o pardal
sò cà vim ver o sol
o teu colo è coeso a tua hábil firme
longa lenta mão acariciando
o fogo do violino
sò cà vim ver o sol
o amor è politico
não è nada contigo
não è nada comigo
o olhar aceso de um menino
enorme a descobrir o mundo
amo quando sem quereres
me proteges do medo
um caule explode
escreves uma árvore plantas
um filho
adormeci de cabeça
traída
e acordei com o coração
màgoado
sò há uma palavra
luminosa
que se deixa em silêncio
o grito
no outono o vento varre
as páginas
aos pès de um livro
as gaivotas são gavetas
de abrir e fechar
o amor è passar a vida inteira
a amar- te
do outro lado
do mundo
e cara a cara
jà não ter força
para dizer
amo - te
as vezes trocamos de lágrimas risinhos
o teu corpo está húmido o meu seco
livres e dados largamo - nos saciados
as mãos coladas ao rosto
no amor não se diz isso sò se faz ao amor
uma molha a alegria iluminada que vem de
dentro a galope à solta e se a lìngua do cavalo
a crina do anjo nos sacode alada a vida ao outro
lado
outras vezes a luz interior pega fogo
a voz do estado de fùria pele medo
e lençol
trocamos de amor com razão verdejante
enquanto o mundo não muda nada là fora
mas a terra a simplicidade e a ternura nova
nos lambem com virulência a realidade
e o meu corpo aprendeu a flutuar
sò quero o teu bem minha querida
amiga invisível mas atenta
as minhas mãos são iguais
as minhas pernas são apenas
árvores
os pès raìzes
os poemas de amor já foram escritos
ditos e escondidos excepto um
o da proporção amar e ser amado
na lâmina do mundo inteiro
mulher homem criança
animal etc ... pelo que lhe
desejo a mesma febre
que sinto
este rosto não tem mascara
sò calor e humildade
o texto não quer unidade
sò calor e humildade
ar de uma fala para um fôlego
já è diferente
tudo o que eu parir posso matar
estou a espera de um livro
não confundo plenitude com
literatura e falar de arte para o
umbigo não faz muito o meu
gènero
sò se fala de amor quando as feridas
estão abertas ou quando a morte
se aproxima
alternadamente são o medo
e a luz do dia a ensinarmos
esse caminho a cada instante
a voz desprende - se de ti
abriga - se num poema
jà não è tua ao mundo
pertence ignorado
as crianças adoecem no inverno
tossem de noite
morres por elas
nesse momento
em que elas precisam de ti
vigias o seu sono
entregas o teu despertar
com facilidade
olhas uma a uma as horas
que passam como se todas as
crianças nascessem no inverno
encontram Deus errando além tempo
na concha praga vazia do nada
vòs não o podeis ver
tornaste vos cegos por causa
do ruído do clarão
a corrida contra a vossa vida
porque estais tão apressados
avançais para o túmulo
se silenciam onde os nossos nomes
se aliam as feridas da infância inacabada
transgredindo os interditos
toco - lhes e eles retinam
acordam o passado
sem passado silencios
separam - nos
silencios recobrem a voz
daqueles que jà cà não estão
já não faço amor
sò amo
sò o amor une
grande a independência
a liberdade
não ler
è como ter vergonha
de perguntar
amas - me ?
há uma razão do sémen
para os poetas se repetirem
os homens não os ouvirem
não ler
è como ir ver o mar
e não olhar para o mar
a paz lavra - se
paz se a palavra
unidade harmonia
fio condutor
linha contínua
corpo virtual
confundir foder
com amor real
ou cobarde
dizer bem de
è redundante
mal è irrelevante
ignorar uma táctica
suja muito perigosa
espiã ou cobarde
atraiçoa a arte
sublinha a cobiça
que leva a medíocre
ao limite da loucura
a paz limpa - se
lava - se a palavra
sobrevive a chama
se colhida livre
por qualquer alma
no instante da tua
certas metáforas começaram a fruir reais
as coisas têm que ser de quem as estima
não de quem as possui
o coração sò flui se ser bom for um dever
bonito um direito
mesmo que não gostes de mim tempo
hei - de ser o teu melhor amigo
a história sempre te traiu
mentiu
e tu sábio sempre a corrigiste
com elegância e compreensão
de pedras preciosas não precisa ela tem uma pérola
que não se precipita que me dà pede todo e não diz
tudo ou nada nem sonha nem avisa
tem um anel de estrelas
sò interessa às invejas
e o cometa
que importa è a forma
como a mão dela
ou minha passam uma
ténue pela outra
ou então pela força
ela não tem pescoço
mas um cálice que ergue
uma taça de luz à raiz ela
nunca se garça
ela sabe que sou dela
se tiver a vontade felina
de ser às vezes minha
uma ternura antiga
a verter horas novas
pode impedir à pressa
o relógio de caixa alta
de bater as lágrimas
uma a uma as gotas
a tempo mas incertas
o correr das teclas
o irritar das balas
o longo percurso
que se chama
à nossa voz
te termos causas
e proteger as casas
já não escrevo bordo o papel
cavalinho è pano
sò na renda viva dos teus
dedos
as palavras fogem
alinham o carinho
um o piano
por isso os teus beijos
nas minhas pálpebras
para engomar silêncio
para fumegar armas
cortar caminho
desatar os medos
abrir - me os olhos
e rasgar o linho
correm no molhe correm ao vento
tive medo que não voltassem
porque as crianças as vezes
não regressam
não se sabe bem porquê
mas elas tambèm morrem
elas frutos solares
romãs laranjas dióspiros
sumarentas no outono
a que vive dentro de mim
tambèm voltou
continua a correr nos meus
dias
sinto os seus pequenos olhos
a brilhar como pregos cromados
sinto os seus dedos a cantar com
a chuva
a criança voltou corre no vento
desesperante e sem remédio
là em baixo pescadores anónimos
de noites sem fim
esperam talvez por um tempo
impossível em que os peixes
todos do mundo
cobertos de lodo e ânsia
como os poetas
saltarão dos seus aquários
enfim livres da sua prisão
enfim livres e aniquilados
tanta coisa quotidiana tão simples
e transparente
como este pequeno coração
palpitante de ilusão
despido ainda de todos os véus
por certo nada encontrarei tão belo
como esta hora tu e eu
mas sigamos nossos imprevisíveis
caminhos aqui um momento cruzados
e quem sabe ?
pudesse eu parar este momento
eternizar este segundo que
jamais voltará ...
ah .... tivesse eu parado o tempo
quando o adolescente que eu era
tambèm sentiu o seu coração
descuidado arfar de felicidade
tivesse o pequeníssimo peixe
saltado do seu aquário
vou firme nas rédeas deslizo
veloz mente
tanta luta tanta coisa mesquinha
tanta baixeza e desespero tanto ...
que as vezes o peixe salta
do seu aquário
e tanta coisa simples
como este amor que
sinto por ti
voemos sobre a terra voemos sobre tanta
grandeza malograda
voemos na brisa deste momento
a meu lado voa minha sombra companheira
inseparável e silenciosa das alegrias e
angústias quotidianas
là em baixo o rio e os barcos os peixes
e os que a linha julga poder liberta - los
adeus meu amor !
adeus !|
voltaremos meu amor carregando nuvens
na aurora
corremos na relva na areia
no orvalho
seremos a estrada
a poeira o girassol
a seara o horizonte
a linguagem surda
dos peixes
crianças deslumbradas
despenteando à beira rio os cabelos
do sol
viajando no silêncio abrindo águas
e em nòs confundindo face e imagem
flor e fruto
crianças nuas
meu amor
carregando nus
nos braços
nos ombros os barcos da aurora
voltaremos um dia meu amor
carregando as nuvens na aurora
corremos na relva na areia
no orvalho
seremos
a estrada a poeira o girassol
a seara o horizonte a linguagem surda
dos peixes
crianças deslumbradas despenteando
os cabelos do sol a beira rio
viajando no silêncio abrindo as águas
e em rios
e em nòs confundindo face e imagem
flor e fruto
crianças nuas meu amor
carregando nos braços nos ombros
os barcos da aurora
nasci num país pequeno onde o aspecto
è mais importante que a alma
onde o que tu ès depende do que possuís
e não do coração que bate dentro de ti
recebo de braços abertos o toque
dos que aconchegam o seu coração
ao meu
sinto a pureza de uma alma
sem precisar de ver a sua cor
se è somente em teu rosto que verei
nascer um dia a madrugada
por que será que nunca te direi
palavras que guardo para ti
contigo sou capaz de falar do tempo
das aves de qualquer coisa inútil
de tubo menos de amor
dos seios e da carne tão macia dos teus
braços
para além das pálpebras onde dormem a noite
e a luz todo o prestígio da fascinação
para além do sexo e dos mistérios que nele
me escondes
em ti começou o tempo não há como conta - lo
senão nos teus braços
em ti acabará um dia mas então tudo terá findado
na espessura da noite próximas
corre ò estrela gloriosa brilha antes que para sempre
nos espaços te afundes
que navio irrompe do teu seu sexo
vindo dos confins da oceânica noite
com marinheiros de todas as raças
trepados nos mastros
que súbita aurora deflagra
a nossa volta que gritos de revolta
dor e triunfo se desfraldam no ar
surpreendidos
eia ... è o teu filho que chega
são as mais poderosas forças
do universo
abrindo entre sangue e dor
a sua torrente indomável
è a primavera que canta nos nossos
troncos
os meus olhos de ontem não são
os mesmos olhos de hoje
um mundo morre e outro mundo
nasce
clara brava companheira
que jamais temeste precipícios
ou sombras
là no fundo dos teus mares que
pequeníssimas mãos se agitam ?
em cada dia morre um homem em mim
em cada dia nasce um homem em mim
sò o itinerário è o mesmo e isso decerto
basta
e eu tenho saudades dos homens que fui
e anseio e espero os homens que serei
dia após dia eu me renasço
sigo em frente